A rivalidade do futebol... onde não tem que haver trolha

No sábado passado, decorreu uma das finais da Liga dos Campeões mais emotivas. Talvez por terem sido duas equipas inglesas, que vivem o fenómeno do futebol de outra forma, sentiu-se um altíssimo índice de emoção, dentro e fora de campo. Claro que cá também vibramos com as rivalidades, os golos e os títulos dos nossos clubes. E muitos também choram, se embebedam à grande e também sabem ver e comentar bola. Mas não é disso que eu estou a falar.

Estou a falar na resistência à noção do conflito quando há rivalidades. Eles são brutos, são pois. Os ingleses são completamente apanhados do clima quando vêm a bola mas têm uma coisa que ainda não existe bem aqui - respeitam-se muito no futebol. Não partem do princípio em que, se és do clube rival, é para ter ódio. Não, eles querem é ver a bola enquanto malham pints em barda, esperando com todas as forças que o seu clube ganha. Se não ganha, cantam na mesma e não é por isso que vão começar a insultar os outros do outro clube.

Esta final deu para se provar muito este ponto de vista. Que eu já me apercebera mas, numa final da Liga dos Campeões, há demasiada emoção que pode levar a comportamentos mais desmedidos. Liverpool e Tottenham nem deram propriamente um jogo brilhante para se ver, foi apenas bom, mas ver adeptos dos dois clubes abraçados e a cantar, enche o coração. Sente-se que não há ali trolha, não há ali vontade em estimular o conflito em sim só porque se ganhou ou perdeu. Há o tal respeito.

Esta forma de estar no futebol dos ingleses manifesta-se, aliás, através de várias formas. O maior exemplo que as claques afectas aos clubes ingleses dão começa logo nos cânticos. Não existem cânticos com teor ofensivo para os outros clubes. Eles só cantam para eles, só querem saber deles. E já os vi inúmeras vezes, a perder ou a ganhar, quando passa um jogador da outra equipa perto das bancadas, para os balneários por estar lesionado, a aplaudi-lo. 

E depois, os outros também dão este exemplo, que seria a prova dos nove - os próprios jogadores. O campeonato inglês não é só melhor pela qualidade de futebol praticada. É a atitude de quem está dentro de campo também. Claro que há desentendimentos, jogadores intragáveis e empurrões ali e acolá. Mas a esmagadora maioria está como que formatada para não alimentar isso. O futebol inglês educou-os para isso. Eles querem é jogar e levar a sua equipa à vitória. Querem lá saber de trolha e isso nota-se perfeitamente em campo pela sua atitude. A postura dos jogadores em terras de Sua Majestade é intencionalmente correcta, educada e conivente com o que vem das bancadas. O estádio é como um só, com as bancadas a fundirem-se com o relvado. E tudo se junta para uma energia positiva. Tudo, num só espectáculo.

Em Portugal, também temos boas energias. Mas é nos nossos clubes, no nosso estádio, quando estamos a ganhar e está tudo feliz. Quando estamos a perder, principalmente para um rival, é facílimo culpar os árbitros e ter vontade de ir aos cornos aos adeptos rivais. Porque há mais essa noção de conflito. Há um ódio diferente entre os principais clubes - Benfica, Sporting e Porto - com cânticos e tarjas ofensivas, envoltos num clima de guerrilha e numa raiva que ultrapassa, por vezes, e para muita pena minha, o amor pelo próprio clube.

Mas isto sempre existiu e não me transforma numa pessoa deprimida quando falo de bola. Isto é normal no futebol nacional e eu sempre me habituei a isso, até porque também sinto um pouco desse ódio, embora não seja o que me move. O que me move é o meu clube mas, perante tudo o que os adeptos dos clubes rivais fazem, e do meu clube também, essa raiva é estimulada e surge, lá está, a tal vontade de conflito. Ou seja, para esse conflito acabar, seria preciso acabar com a postura ofensiva. Não há necessidade dela.

Vamos olhar mais para os adeptos ingleses. Não para os que partem lojas e não sabem estar. Isso é o extremismo, representado pelos Hooligans. Porque desses há em todo o lado e, acreditem, eles são em esmagadora minoria. A maior parte quer ver bola e não tem problema, no fim de um jogo, em ir cumprimentar malta do outro clube. Nós também temos disso, repito, mas não é costume. E o nosso futebol seria muito menos tóxico. 

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